Martelo da Justiça |
Questões sobre várias situações relativas aos contratos escolares
A notícia, abaixo copiada, é longa, e foi publicada no site
do STJ em janeiro de 2012, mas, é atual e vale a pena dedicar tempo aos
esclarecimentos de questões sobre penalidade pedagógica, retenção de
certificado, multa administrativa, atuação do MP, impontualidade vs.
inadimplência, pai devedor, carga horária e cobrança integral.
Leia e faça seu comentário.
"A aplicação da jurisprudência do STJ aos contratos
escolares
A educação no Brasil é um direito definido pela
Constituição, mas nem sempre é ao Estado que o cidadão recorre para tê-lo
assegurado.
Quando a opção é pelo ensino particular, a natureza jurídica
da relação entre instituição e aluno passa ser de prestação de serviço. O
Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem precedentes e jurisprudência consolidada
sobre diversos temas relacionados à cobrança de mensalidades, reajustes e
obrigações das escolas com os alunos.
O universo do ensino privado no Brasil cresceu nos últimos
cinco anos. É o que revelam dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
O Censo Escolar 2010 mostrou que o Brasil tinha, à época,
7,5 milhões de estudantes matriculados na educação básica privada – creche,
pré-escola, ensino fundamental e médio, educação profissional, especial e de
jovens e adultos. No total de estudantes, as escolas particulares ficaram com
uma fatia de 14,6%. Em 2007, eram 6,3 milhões de alunos matriculados na rede
privada.
Com a demanda crescente, a quantidade de escolas e
faculdades particulares também se multiplicou. A Fundação Getúlio Vargas (FGV),
em estudo realizado para a Federação
Nacional das Escolas Particulares (FENEP), em 2005, contabilizava 36.800
estabelecimentos de ensino privado no país.
Penalidade pedagógica
Legislação e jurisprudência são claras ao garantir que a
existência de débitos junto à instituição de ensino não deve interferir na
prestação dos serviços educacionais. O artigo 6º da Lei 9.870/99 diz que “são
proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares
ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de
inadimplemento”.
Os débitos devem ser exigidos em ação própria, sendo vedada
à entidade educacional interferir na atividade acadêmica dos seus estudantes
para obter o adimplemento de mensalidades escolares. Ainda assim, a prática é
comum e o debate chega ao STJ em recursos das partes.
Em 2008, a Primeira Turma considerou nula cláusula
contratual que condicionava o trancamento de matrícula ao pagamento do
correspondente período semestral em que requerido o trancamento, bem como à
quitação das parcelas em atraso. O relator, ministro Benedito Gonçalves,
entendeu que a prática constitui penalidade pedagógica vedada pela legislação.
“Ao trancar a matrícula, o aluno fica fora da faculdade, não
frequenta aulas e não participa de nenhuma atividade relacionada com o curso,
de modo que não pode ficar refém da instituição e ver-se compelido a pagar por
serviços que não viria receber, para poder se afastar temporariamente da
universidade”, afirmou o ministro.
O ministro não nega que o estabelecimento educacional tenha
o direito de receber os valores que lhe são devidos, mas reitera que não pode
ele lançar mãos de meios proibidos por lei para tanto, devendo se valer dos
procedimentos legais de cobranças judiciais (REsp 1.081.936).
Retenção de certificado
A inadimplência também não é justificativa para que a
instituição de ensino se recuse a entregar o certificado de conclusão de curso
ao aluno. O entendimento foi da Segunda Turma, que enfrentou a questão em 2008,
no julgamento de um recurso de um centro universitário de Vila Velha (ES).
O relator foi o ministro Mauro Campbell. A instituição
alegava que a solenidade de colação de grau não seria abrangida pela proteção
legal, sendo que sua proibição não seria penalidade pedagógica. Mas para o
ministro, a vedação legal de retenção de documentos escolares abrange o ato de
colação de grau e o direito de obter o respectivo certificado (REsp 913.917).
Multa administrativa
Os alunos de escolas particulares são consumidores na medida
em que utilizam um serviço final. Já as escolas e faculdades particulares podem
ser consideradas fornecedoras, pois são pessoas jurídicas que oferecem o
ensino. Assim, sujeitam-se também ao Código de Defesa do Consumidor (CDC) e aos
órgãos de proteção.
Em 2010, a Primeira Turma decidiu restabelecer uma multa
aplicada pelo Procon de São Paulo contra a mantenedora de uma escola que reteve
documentos para transferência de dois alunos, por falta de pagamento de
mensalidades. O relator foi o ministro Luiz Fux, que hoje atua no Supremo
Tribunal Federal (STF).
No caso, o Procon/SP instaurou processo administrativo
contra a escola, que resultou na aplicação de uma multa de R$ 5 mil, seguindo o
artigo 56 do CDC. A escola ajuizou ação para que fosse desobrigada do pagamento
da multa, tendo em vista que, em audiência judicial de conciliação, ela
entregou a documentação e os devedores comprometeram-se a pagar os débitos.
No julgamento do recurso do Procon/SP, o ministro Fux
destacou que acordo entre o consumidor e o prestador de serviços, ainda que
realizado em juízo, não afasta a multa, aplicada por órgão de proteção e defesa
do consumidor, no exercício do poder de punição do Estado. Isso porque a multa
não visa à reparação de dano sofrido pelo consumidor, mas à punição pela
infração (REsp 1.164.146).
Atuação do MP
O STJ reconhece a legitimidade do Ministério Público para
promover ação civil pública onde se discute a defesa dos interesses coletivos
de pais e alunos de estabelecimento de ensino. São diversos os recursos que
chegaram ao Tribunal contestando a atuação do MP nos casos em que se discute,
por exemplo, reajuste de mensalidades. A jurisprudência do STJ é pacífica nesse
sentido (REsp 120.143).
Impontualidade vs. inadimplência
O aluno, ao matricular-se em instituição de ensino privado,
firma contrato em que se obriga ao pagamento das mensalidades como
contraprestação ao serviço recebido. Mas o atraso no pagamento não autoriza a
aplicação de sanções que resultem em descumprimento do contrato por parte da
entidade de ensino (artigo 5º da Lei 9.870/99).
Esse é o entendimento do STJ. A universidade não pode impor
penalidades administrativas ao aluno inadimplente, o qual tem o direito de
assistir a aulas, realizar provas e obter documentos.
A Segunda Turma reafirmou esta tese na análise de um recurso
interposto por uma universidade de São Paulo. Naquele caso, a relatora,
ministra Eliana Calmon, destacou, porém, que o STJ considera que a falta de
pagamento até 90 dias é, para efeito da lei, impontualidade. Só é inadimplente
o aluno que exceder esse prazo. Assim, a entidade está autorizada a não renovar
a matrícula se o atraso é superior a 90 dias, mesmo que seja de uma mensalidade
apenas. “O aluno que deve uma, duas, três ou quatro prestações, para evitar a
pecha de inadimplente, deve quitá-las no prazo de 90 dias”, alertou a ministra
no julgamento (REsp 725.955).
Pai devedor
Noutro caso, a Segunda Turma manteve decisão que garantiu a
uma aluna a rematrícula no curso de Direito. A faculdade havia negado a
renovação porque o pai da estudante, aluno do curso de Ciências Contábeis na
mesma instituição de ensino, estava com mensalidades em atraso. No STJ, o
recurso do centro universitário alegava que como os pais são, via de regra, os
representantes capazes dos alunos, o impedimento previsto em lei deveria ser
aplicado ao caso.
O relator, ministro Mauro Campbell Marques, considerou que a
inadimplência não se referia à aluna, mas a terceiro, e por isso deveria ser
afastada a exceção que possibilita o impedimento à renovação de matrícula
prevista na Lei 9.870/99 (REsp 1.096.242).
O STJ também já definiu que é da Justiça Federal a
competência para julgar mandado de segurança impetrado contra ato de dirigente
de instituição particular de ensino que nega a renovação de matrícula de aluno
inadimplente (REsp 883.497).
Carga horária
Em um julgamento ocorrido em 2011, a Quarta Turma decidiu
que, mesmo após a colação de grau, os alunos ainda podem exigir indenização por
carga horária do curso não ministrada pela instituição de ensino. A ação foi
movida por ex-alunos da Fundação Universidade do Vale do Itajaí (Univali), de
Santa Catarina, para obter ressarcimento por horas-aula não ministradas. O
relator do recurso é o ministro Luis Felipe Salomão.
Os alunos teriam pago o equivalente a 20 créditos em aulas
do 5º período do curso de direito, mas foram ministradas aulas equivalentes a
16 créditos. Em primeira instância, eles tiveram sucesso, mas o Tribunal de
Justiça de Santa Catariana (TJSC) considerou que, com a colação de grau, os
estudantes teriam aberto mão de seus direitos.
O ministro Salomão destacou em seu voto que no processo fica
claro que não foram prestadas as 3.390 horas-aula previstas para o curso e
pagas pelos alunos. “O quê se verifica no caso é que a recorrida [Univali] se
comprometeu em prestar um serviço, recebeu por ele, e não cumpriu com o
avençado”, apontou. O relator observou que houve resistência dos alunos e que,
em nenhum momento, abriram mão de seus direitos. Não houve remissão ou perdão
da dívida, já que não se demonstrou o ânimo de abandonar o débito – a
jurisprudência do Tribunal é nesse sentido (REsp 895.480).
Cobrança integral
Em 2002, o STJ analisou um recurso em que um aluno de Minas
Gerais contestava a cobrança da semestralidade integral quando estava
matriculado em apenas uma disciplina do curso de engenharia. O caso foi julgado
na Quarta Turma.
Os ministros entenderam que deveria ser respeitada a equivalência entre a prestação cobrada do aluno e a contraprestação oferecida pela escola.
“Se falta apenas uma disciplina a ser cursada, não pode ser
exigido o pagamento de semestralidade integral, embora não se exija, nesse
caso, a exata proporcionalidade”, afirmou em seu voto o relator, ministro Ruy
Rosado, já aposentado.
A Turma ressaltou que não se impunha a proporcionalidade
entre o número de cadeiras e o valor da prestação. Para os ministros, no caso
de inscrição em apenas uma disciplina deve-se considerar o fato de que a escola
deve manter o integral funcionamento das suas dependências, o que justifica a
cobrança de valor maior, além do que corresponderia à exata proporcionalidade
de uma matéria (REsp 334.837)."
Final
Por fim, o objetivo dessa publicação é, exclusivamente, informar de forma clara e direta, o tema aqui colocado.
Assim, para saber outras informações interessantes sobre assuntos jurídicos Clique Aqui.